segunda-feira, 1 de setembro de 2014

O DIREITO COMO ELEMENTO DE TRANSFORMAÇÃO SOCIAL -...

O DIREITO COMO ELEMENTO DE TRANFORMAÇÃO SOCIAL – DIÁLOGO ENTRE UM PROFESSOR E SEU ALUNO.

Desde o advento da Constituinte de 1988, sua aprovação e regulamentação, o país tem mergulhado num espiral de conflitos de governabilidade sem igual, é inegável a forma com que as estruturas Republicanas de Gestão do Estado têm se mostrado inaptas em acompanhar todas as evoluções ocorridas. Num momento em que a globalização se mostra cada vez mais contundente, disseminando a informação de forma ampla e acessível a todos, os entes estatais parecem cerrar os olhos à nova realidade, onde o cidadão comum de posse deste verdadeiro arsenal de informações tende a assumir um papel muito mais crítico do que tinha há apenas alguns anos atrás. Passando rapidamente pelas muitas causas prováveis desta perda de rumo, podemos observar que algumas delas, dado ao seu caráter geral, são mais evidenciadas e conseqüentemente mais exploradas teoricamente pelos autores, as quais passaremos a analisar sucintamente.




Sendo certo ainda que, nos estreitos limites do presente “diálogo” não nos permite aprofundamento teórico sobre os temas propostos, mesmo porque, cada tema aqui proposto e sucintamente debatido é fruto de inquietações e inconformações de ambas as partes debatedoras, afloradas em um momento de transição paradigmática onde se abandona o radicalismo do positivismo, adentrando de forma agressiva no âmbito do Neoconstitucionalismo (sic), aspirações pessoais das partes inerentes à forma de ensino adotada nas cadeiras acadêmicas da graduação, demonstrando assim a necessidade de que dogmas e aspirações sejam repensadas, sempre, objetivando alcançar o inalcançável, a perfeição jurídica, essa utopia que nos leva a buscar cada vez mais o aprendizado, a critica e a sistematização de todo o ordenamento jurídico, não só como norma escrita, repetidora de casos já previamente definidos, mas como forma transformadora da sociedade assumindo assim importância política do nosso agora e principalmente do futuro.
1. Estagnação Política
O sistema político brasileiro, após apenas 22 anos de promulgação da constituição de 1988, demonstra claramente um desgaste institucional irreparável. A incapacidade dos partidos Políticos de agregar valores de interesse social, a gritante desproporcionalidade dos interesses sociais versus interesses corporativos dentro do congresso nacional e demais casas legislativas, onde os ideários do real desenvolvimento econômico, político e social, sem falar nos aspectos de desenvolvimento cultural e ambiental, a serem abordados com mais detalhes posteriormente, são ao meu ver, subrepresentados. Enquanto isto nos estados, as forças oligárquicas, assustadoramente ainda imperam, conseguindo sempre o quorum de representantes que necessitam, impondo as suas “próprias razões” em detrimento de tudo e de todos, verdadeiro cancro cujos interesses se perpetuam eternamente, interesses regionais conflitantes que secularmente obstam o entendimento nacional.  Este verdadeiro caos político é potencializado em ano eleitoral, onde mais do que nunca, contrariando a premissa de que "todo poder emana do povo" fica evidenciada a superposição dos interesses particulares em detrimento dos sociais, a começar do nosso máximo dignitário!
Observa-se das colocações acima expostas a angustia de quem parece ver aquilo que ninguém (políticos e autoridades no geral) vê. Expectativas frustradas, direitos suprimidos, inversão de valores e submissão daquilo que era pra ser o ponto central a ser perseguido. Indistintamente, parece retrocedermos ao denominado por Norberto Bobbio como “Maquiavelismo” onde o que importa é a vontade do “Príncipe”, aqui representado pelos governantes, e não a do povo , ele (s) e seu (s) interesses, é o que mais importa, seu (s) querer (s) são as leis, aquilo que deve ser respeitado e seguido, estamos diante de um verdadeiro “estado totalitário” onde o poder é soberano a tudo, e defino como poder, o dinheiro, a posição social, e principalmente o cargo publico de autoridade a ser exercido, tratado e conduzido em prol do “Príncipe”. Com isso observe a real inversão de valores, parece absurdamente que voltarmos às eras obscuras e fétidas de nossa historia política, onde o povo, e só o povo, gente, ou porque não, coisa, sem valor, deve-se submeter indistintamente e totalitáriamente aos fins pessoais, almejados pelas autoridades publicas.
O fato de estarmos em ano eleitoral, em nada muda, apenas infla, a expressão demagoga e mesquinha de enaltecer e priorizar o povo. Mera hipocrisia eleitoral. Tudo para ser o próximo “Príncipe”.

2. Desenvolvimento econômico versus Legalidade

O país passa atualmente por um grande dilema entre a legalidade e o desenvolvimento econômico, por exemplo, recentemente TCU E MP tiveram suas recomendações de paralisação de obras do PAC, contrariadas pelo Planalto, que removeu várias obras públicas com suspeita de superfaturamento, sobrepreço e critérios de medição inadequados da chamada "lista Negra", esta crise de identidade do Brasil não pode passar incólume pelo crivo da história, o país necessita realmente de estruturação econômica de forma a poder competir no cenário mundial em pé de igualdade com os outros emergentes, porém a que custo? Em detrimento do sistema legal e do estado democrático de direito? É um absurdo vermos, a despeito da legalidade e em nome do desenvolvimento econômico, os diplomas legais sendo vilipendiados por interesses alienígenas, pois as irregularidades de uma obra bilionária não podem ser ignoradas.  É, no mínimo, temerária a destinação dos recursos sob suspeita, vivemos uma democracia representativa ou na verdade um sistema de exceção travestido de democracia? Perdemos completamente a racionalidade decisória, esquecemos os princípios básicos da administração pública, onde está a legalidade, a eficiência? A premência de um pretenso desenvolvimento econômico poderá sublevar os sagrados princípios antes citados e este é realmente o único caminho do desenvolvimento? Sem dúvida o caminho da legalidade sempre será o melhor, o mais seguro, por mais demorado que seja, principalmente porque a exigüidade do tempo apregoada pelo executivo se deve sim a proximidade eleitoral, e não ao comprometimento com o desenvolvimento nacional. Chegamos a um ponto onde as contradições se retroalimentarão indefinidamente se não iniciarmos um processo de desfragmentação da lógica de atuação do Estado Brasileiro, através da adoção de um padrão de juridicidade realmente constitucional, devemos recorrer sempre ao texto constitucional ou ter a coragem mudá-lo de forma a atender as modernas demandas estatais, o que não podemos é nos acostumar as inconstitucionalidades cada vez mais constantes, as quebras do ordenamento jurídico em função dos interesses mais variados sob a premissa da falta de contextualização da Constituição Federal, Respeite-a ou mude-a!
Nunca antes na historia desse pais, se falou tanto em desenvolvimento sustentável ou mesmo, em estabilização da economia, isso muito nos alegra, desde que não viole ou destrua aquilo que por décadas, ou melhor, séculos construímos, um Estado Democrático de Direitos, sendo seu significado a submissão não só da população como também do próprio Estado às leis, inúmeras vezes vejo o Estado ser confundido, misturado, com o Governo, privilegiando aquilo que se diz ser importante, como se a conquista histórica de uma Constituição democrática e suas bases estruturais fossem resumidas a um segundo plano de priorização. Devemos tomar cuidado ao falarmos de violação de regras, que se limita a leis formalmente constituídas, a regra, possui, um sentido mais abrangente, que como afirmo Robert Alexy, são elevadas a patamares de gênero, sendo assim, leis e princípios são tidos também como regras, o que se deve priorizar não é apenas o que está literalmente expresso em uma lei, deve-se levar em conta a sua origem o seu objetivo o seu contexto, aquilo que visa abranger. Os Princípios de Direito, verdadeiros alicerces de nosso ordenamento jurídico, são diariamente desprezados, para não me delongar ainda demais, cito por todos, a MORALIDADE parece ser norma vazia, sem conteúdo, pois nunca é respeitada e quando invocada é descartado sob a pífia afirmação de que é muito genérica sua definição, ou seja, rasgue-a e queime-a, pois pra nada serve, mesmo porque, o que importa é a vontade do “Principe”. 

3. Desagregação Social

No bojo de toda esta crise institucional está a desintegração do sistema social, onde a quantificação da miséria tornou-se moeda de troca política: quanto mais pobre maior controle estatal e maior a dependência social dos ditos "programas", sem contar no destrutivo processo de "proletarização" da classe média a qual nunca sofreu tanto quanto nos últimos anos pilhada pelo peso dos impostos e sitiada dentro de seus lares, temendo a perda dos poucos recursos que lhes restou. O recrudescimento da violência nos grandes centros urbanos e o descrédito pelas instituições criou uma glamourização da violência, uma verdadeira cultura da justiça com as próprias mãos, bem como a desconsideração pelos direitos humanos em que grupos de extermínio, milícias e congêneres, constituem uma das trágicas seqüelas da desagregação social.
Planos assistencialistas são importantes, são, distribuem rendas e levam a esperança aos que jamais tiveram antes, mas será que apenas isto basta? Parece-me óbvio que não, após este fato, deveria o mesmo ser “substituído” por uma qualificação, cultuar a valorização daquilo que se recebe, incentivar a não estagnar sob a afirmação de que está bom, antes não havia nada, agora temos algo. Chega, não somo alienados a ponto de nos satisfazermos com esmolas, igualdade social não é dar um trocado aqui e outro ali, a sociedade grita, em voz bem alta, por educação, saúde, emprego, dignidade, respeito e outros mais. Não podemos resolver problemas de segurança publica com o direito penal, a imposição de sanções severas, ou será que estou errado em pensar que prevenir é melhor que remediar, educar é melhor que prender e cuidar com respeito é melhor que descriminar. Por um acaso o filho do “Príncipe” estuda em escola publica, se consulta pelo SUS e enfrenta filas em busca de um emprego? 

4. Descaminho Cultural

Também não poderíamos deixar de citar a constante desmobilização cultural sofrida pela população, há uma contundente crise de motivação nos meios culturais, a fecundidade cultural em todos os meios nunca esteve tão estagnada, as classes mais baixas da população, que sempre foram caracterizadas pela pródiga produção cultural, trazendo a lume nomes perenes no cenário cultural até os dias de hoje, se limitam a reproduzir batidas ininteligíveis e corpos nus num verdadeiro "Império dos sentidos" não há mais a poesia do samba, das modas de viola e da seresta, neste mesmo contexto não há espaço para os verdadeiros movimentos sociais. Aonde caberia o censo de coletividade num meio de culto as sensações individuais, não é de se admirar que a intolerância social nunca foi tão marcante, estampada diariamente nas páginas dos noticiários. Tal postura individualista do ser humano, toda esta desmotivação é em grande parte responsabilidade do estado que ao furtar-se de suas responsabilidades, deixa o homem a sua própria sorte, não direcionando políticas culturais e conseqüentemente não aguardando resultados, nada se pede  e também nada se faz.
Cultura, só se for a da “lei de Gerson – se dar bem a qualquer custo”, nada se produziu, vivemos do passado, verdadeiramente “governados pelos mortos”, pois os vivos parecem que não existem, exceto as exibições maciças de corpos nuns completamente “modificados cientificamente em laboratórios” não se fala ou mesmo se mostra outra coisa, além disso, raras são as expressões culturais que levam um mover emotivo de nosso pensar, dói, pensar na cultura atual, pois é vazia, escassa de conteúdo, completamente aculturada, sem incentivo, sem investimento, hoje a cultura é sub julgada como coisa secundaria, sem valor expressivo, onde com isso se manipula a todos a focarem aquilo que querem que se preocupem. Talvez um dia veremos isso mudar!   

5. Equívoco Ambiental

Como alguém que se sente sozinho, desamparado pelo estado se comportaria com relação ao ambiente em que vive? Ao vermos as encostas dos morros pilhadas de lixo, por vezes indignamo-nos, porém como racionalizar os óbices ambientais sem antes darmos soluções ao cidadão, que por vezes não se sente como tal, a implementação de políticas publicas na área ambiental, pecam por omitirem uma variável de suma importância na equação da preservação ambiental: o ser humano! Despoluem-se as águas, porém o homem continua na sub-moradia, sem saneamento e nem coleta de lixo, sem escola e sem emprego, objetiva-se mais o "néon" da placa de inauguração do que a moradia digna ao ser humano. Coíbe-se o desmatamento, encarcera-se o lenhador e o madeireiro continua livre, onde estão as alternativas de emprego ao lenhador, ao carvoeiro? E o menor semi-escravizado, onde estudará? Torno a repetir, toda a política ambiental é nula se não passa em primeiro lugar pela dignidade do homem!
O “Príncipe” encontrou a melhor forma de se livrar da responsabilidade das conseqüências de catástrofes ambientais “o povo suja as ruas e entope os bueiros com sua falta de educação”, ou seja, a culpa é do povo, não é da falta de estrutura de uma grande cidade, que cresce desordenadamente, não é dos responsáveis pela manutenção e criação de novos mecanismos de tratamento e escoamento d’água, não é daqueles a quem compete zelar pelo bem estar social e cultural, a falta de educação do povo também não é das autoridades, pois pelo visto, de acordo com as afirmações por eles prestadas, educação eles dão. Enfim. Acho que na verdade, a culpa realmente é do povo, que insiste em insistir nessa forma de administração publica.   

 

6. Causas Históricas

Ao verificarmos todos os óbices aqui apresentados, temos a certeza de que somente a história pode explicar um estado atual de coisas de tão grande gravidade. De forma realista, sabe-se que sempre as elites foram as responsáveis pelos destinos do povo, pelos rumos tomados por uma nação ora em formação, ao retrocedermos no tempo, podemos constatar que a forma de colonização do Brasil influiu preponderantemente na maneira em que nos apresentamos hoje como povo, como é a nossa personalidade enquanto Estado Independente, interna e externamente. Nosso país surgiu como colônia de exploração e durante 30 anos após o seu descobrimento não despertou interesse da coroa Portuguesa, somente após a ameaça iminente de perda total do território para França e Holanda é que a decisão de colonizar foi tomada, exatamente por não possuir atrativos econômicos, fato somente superado através da exploração do Pau-Brasil. Sucedem-se então no Brasil - Colônia, vários ciclos econômicos, caracterizados exclusivamente pelo exaurimento dos recursos naturais pátrios em face da coroa portuguesa, sem preocupação alguma com a Colônia propriamente dita. Capitanias Hereditárias, A União Ibérica e a conseqüente Expansão Territorial através dos Bandeirantes e os Vice-reis, culminando na vinda da Família Real em 1808, tudo motivado pela política colonial de Exploração, e após a "Independência" em 1822 surge um novo Estado, com características bem peculiares, onde a união entre a tradição agrária/extrativista une-se a corrupção estatal, prática portuguesa muito bem aprendida, e posta em uso até os dias de hoje, que já àquela época dava bem seus ares, tornando-nos desde a origem um estado dependente e corrupto, agora das potências emergentes: Inglaterra e EUA, o último ao qual ainda hoje prestamos reverência, a despeito da resistência de alguns em admitir tal fato. Somente adentramos a Revolução industrial nos anos 30 do séc. XX, curiosamente pelas mãos de um ditador e desde então vivemos nos altos e baixos das tentativas isoladas de nos livramos da herança maldita de séculos de exploração, levantando e tombando em meio ao descaminho de recursos, corrupção, falta de amor ao verdadeiro sentido de pátria, pois todos os nossos destinos foram traçados por terceiros, e nós povo, sempre nos conformando em assistir a distância às ditas "revoluções" (todas elas!), salvo raríssimas exceções. Me pergunto o porquê dos maiores rompantes de desenvolvimento de fato deste país terem sido engendrados através de líderes populares, independentemente do tempo, avessos quase sempre à discussão democrática  e a um custo altíssimo para a sociedade seja em termos de supressão das liberdades individuais, seja da dilapidação do erário público ou de ambos, será que sempre teremos que pagar tal preço pelo desenvolvimento? Quando nossas instituições democráticas estarão maduras o suficiente para promover o Brasil sem o efeito colateral de ônus sociais tão altos e sem a necessidade do famigerado populismo? Estamos acostumados a estar à margem das decisões, pois sempre há alguém "mais preparado" para tomar as grandes decisões em nome do povo, que tem sua parcela de culpa no imediatismo egoísta do colonizado, mas também foi cuidadosamente mantido inculto, marginalizado de todos os processos políticos da história brasileira, com a única razão de obedecer sem questionar os jugos que lhes eram impostos. Hoje em pleno séc. XXI ainda há quem não enxergue que o Brasil só será passado a limpo quando uma parcela significativa da sociedade participar de fato do processo político, finalmente subjugando a maldição da colônia. Como isto se dará, somente o tempo e a educação dirão.
Comparo esse retroceder histórico como de suma importância para com nossa realidade, a historia, e somente ela, nos diz quem somo, de onde viemos, e para onde vamos, passamos, por todas as etapas evolutivas de uma sociedade totalitarista, déspota, rumo a uma qualificação libertária, democrata, preocupada em um primeiro momento com a dignidade da pessoa individualmente considerada (direitos fundamentais de 1ª geração), visando proteger sua liberdade, dos ataques déspotas governamentais, conseqüentemente passamos uma nova fase de proteção de nossos Direitos Fundamentais, a contra prestação estatal, onde o Estado passa a ser o responsável em priorizar direitos como também a protegê-los de forma eficaz, no atual estágio em que nos encontramos, estamos na era dos direito Fundamentais de 3ª geração, onde se busca a proteção e respeito aos direitos sociais, tudo isso, fruto de um percurso histórico, de evoluções filosóficas, jurídicas, sociais e políticas. Com isso, vê-se a importância da história, das origens remotas e próximas de nossa cultura em um todo, nosso passado não profetiza nosso futuro, devemos sim, pleitear, lutar e esbravejar por uma história digna, onde a luta incansável pela melhoria foi marco inspirador nas batalhas.
O estado liberal com a abertura dos portos e livre comercialização de produtos foi apenas a mola propulsora de toda essa trajetória histórica, mesmo antes de sermos descobertos, o que ocorre, em meu ponto de vista, é a falta de interesse governamental e mudar o rumo dessa história, cabendo novamente a nós, povo brasileiro, entrarmos no campo de batalha, e lutarmos com todas as forças, para só assim, podermos ver nossos anseios saciados.     

7. O Papel Transformador do Direito

Depois de todo este contexto apresentado, adentro a seara do Direito questionando: a que se destina o papel do Direito nesta sociedade? Qual sua finalidade, seu objetivo? Seria ele um mero reprodutor desta realidade social, que utiliza formulas prontas e doutrinas muitas vezes alienígenas à nossa verdade social? O que se observa ultimamente é uma verdadeira enxurrada de pensamentos arcaicos, despejados voluptosamente no mercado em função da recente demanda editorial.  Preocupante o fato de que a grande maioria das ditas “doutrinas” em nada tem de originais, tratam-se meramente de reproduções de verdades prontas e reconhecidas como inquestionáveis, que poucos se atrevem a contestar ou inovar sob o risco de desmoralização, pois surgiram das idéias dos “saudosos” grandes mestres A, B ou C! Não estaríamos nós operadores do direito desviando-nos da finalidade mais nobre da causa, que é utilizar o Direito como elemento de Transformação social e não como mantenedor do estado atual das coisas? .     
Não estou aqui cometendo a heresia de invalidar a contribuição dos grandes mestres, mas preocupa-me a aparente crise legal que vivemos hoje em dia, crise esta que, verdadeira ferida aberta no tecido social, talvez seja oriunda do comodismo intelectual a que nos submetemos, pois estamos limitados a apenas absorver um conhecimento “requentado” sem questionar a sua contextualidade, temos que aprender a separar o “joio do trigo...”.
   Todas as grandes transformações ocorridas na história humana, desde a Queda da Bastilha e a Revolução Industrial, receberem em seu seio a contribuição ativa dos Operadores do Direito que ao questionar as ditas "verdades universais" e, sobretudo revestidos de coragem, enfrentaram pensamentos modais e atitudes rotineiras da sociedade vigente por vezes com o sacrifício da própria vida. Ocorre-me que sendo a História da humanidade cíclica, vez por outra cabe ao Operador do Direito, causar agitação na "água do poço" de forma a forçar as pessoas a reverem seus conceitos e alterarem o "in statu quo res erant ante bellum" através do PENSAMENTO E DA PALAVRA. Assim sendo, se nos limitarmos somente a acatar e reproduzir cegamente o pensamento alheio estaremos negando o caráter transformador histórico do nosso sacerdócio.
 É muito interessante observar que embora o Fenômeno do Direito emane obviamente do seio da sociedade e preexista até à idéia de Estado, muitos ainda insistem em elevar a materialidade do fenômeno Jurídico a um patamar exagerado, ignorando a subjetividade que lhe é característica. Ora, o ser humano é na sua essência subjetivo! Seria extremamente simplista afirmar que Direito é somente a Fria Letra, a Coisa, O Fato ou O Procedimento, também o é! Mas, principalmente, Direito são as pessoas e as pessoas mudam, mudam de opinião, de humor, de lugar, etc. O direto será sempre um canal de mudanças enquanto oriundo do "querer coletivo", como ensina Miguel Reale em suas Lições Preliminares de Direito.
Talvez exatamente por conseguir exprimir a vontade humana, assuste tanto a idéia de discussão, que longe do sentido pejorativo proporciona um embate Intelectual, construindo "novas metas e meios sociais" nas palavras de Robert King Merton em sua obra Estrutura Social e Anomia. É essa a função transformadora do Direito, a qual atende aos anseios da população, e que longe das verdades comerciais proporciona um Norte para a sociedade, e quem tem a bússola nas mãos somos nós operadores do Direito!
Essa influência do direito na realidade, tem efeitos concretos na nossa história recente, um bom exemplo é o dado pelo juiz Pernambucano Pierre Couto Maior Coutinho de Amorim: "Exemplo claro da possibilidade de influência do direito, agora na acepção objetiva/subjetiva, está na aplicação do Código de Defesa do Consumidor, lei n. 8.078/90. Notou-se uma grande mudança na qualidade dos bens de consumo colocados no mercado após a validade e vigência desta lei. O consumidor brasileiro passou a exigir em maior grau um bom nível na qualidade dos produtos e uma conduta mais ética dos fornecedores desses bens. E quando não adimplidas essas exigências, os juristas aplicaram as sanções previstas, o que terminou por modificar o meio social."  O nobre jurista aqui afirma que a atuação objetiva do Direito do Consumidor, resposta estatal ao clamor social, terminou por modificar condutas, alterou objetivamente o dia-a-dia da população, que até então sofria com a falta de qualidade de produtos e serviços e a partir da vigência do novo diploma experimentou uma mudança radical da referida qualidade.
De fato, ainda há muito a ser explorado e definido nesta seara: a real valoração dos direitos fundamentais no ordenamento jurídico, uma Nova Hermenêutica Constitucional, Civil, Penal, etc. Tudo isto, em face da nova sociedade que se apresenta, têm ainda um ideário difuso, e talvez este seja um dos principais motivos, pelo qual o culto à forma e ao objeto ainda estejam tão presentes, subestimando a vastidão do universo das interações socioculturais. Cabe-nos então, lutar pela incorporação mais célere da dignidade humana às normas, seu reconhecimento pela ordem jurídica e pelo mundo acadêmico, trazendo cada vez mais as questões sociais a lume e demovendo seus opositores (que não são poucos) do cômodo e seguro “berço esplêndido”.
Por muito tempo a comunidade jurídica, estagnou, ao ater-se à denominada pseudodoutrina, ou seja, pensam que doutrinam, manuais meramente repetitivos, como se estivessem se acovardando frente a realidade transformadora que é o direito, limitando-se a transcrever o que se escreveu, sem pesquisa, sem cultura, sem interesse em ensinar, apenas interesse em vender. Infelizmente, vivemos um verdadeiro “estelionato intelectual”, não no sentido jurídico da palavra, mas em seu sentido social. Certa vez ouvi, de forma infeliz um dito “doutrinador” afirmar que, “mente aquele que diz não temer se contradizer”, ora, somente se contradiz aquele que pensa, escreve e evolui, assim já afirmava o professor Paulo Nader. Logo, apenas aqueles que pensam, evoluem e logicamente estudam é que podem fazer a diferença dentro deste contexto em que vivemos.
Quanto ao fato de estarmos vivenciando uma crise intelectual, remeto ao dialogo acima já firmado.
A titulo conclusivo desse diálogo, tão inspirador e rico em informações, argüições e expressões de revolta, ou melhor, indignação com a realidade atual que circunda nossos sombrosos dias, deixo uma expressão, muito eloqüente que talvez seja a mais realista e definidora dessa história. Boaventura de Souza Santos dizia: “é, pois, justificado a advertência sobre descobrirmos com atraso o que sabíamos quando nos considerávamos atrasados”.
Ora, sejamos óbvios com nossa realidade, pois a meu ver, o objetivo desta estagnação social, jurídica e política, redundará em objetivos predominantemente destruidores, mantendo a presente ordem, e até mesmo subvertendo o resquício da política democratizada alcançada pelas lutas e vitórias mostradas por nossa história.
Passar bem, e que seus anseios sejam apenas, como um instrumento de alcance intelectual, “nunca antes visto na historia desse pais”!

Publicado por: João Paulo da Silva Faria
Fonte: http://www.ebah.com.br/content/ABAAAAwEMAK/direito-como-elemento-transformacao-social-http-direitosociedadeeutilidade-blogspot-com

Nenhum comentário:

Postar um comentário