O DIREITO COMO ELEMENTO DE TRANFORMAÇÃO SOCIAL – DIÁLOGO ENTRE
UM PROFESSOR E SEU ALUNO.
Desde o advento da Constituinte de 1988, sua aprovação e
regulamentação, o país tem mergulhado num espiral de conflitos de
governabilidade sem igual, é inegável a forma com que as estruturas
Republicanas de Gestão do Estado têm se mostrado inaptas em acompanhar todas as
evoluções ocorridas. Num momento em que a globalização se mostra cada vez mais
contundente, disseminando a informação de forma ampla e acessível a todos, os
entes estatais parecem cerrar os olhos à nova realidade, onde o cidadão comum
de posse deste verdadeiro arsenal de informações tende a assumir um papel muito
mais crítico do que tinha há apenas alguns anos atrás. Passando rapidamente
pelas muitas causas prováveis desta perda de rumo, podemos observar que algumas
delas, dado ao seu caráter geral, são mais evidenciadas e conseqüentemente mais
exploradas teoricamente pelos autores, as quais passaremos a analisar
sucintamente.
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Sendo certo ainda que, nos estreitos limites do presente
“diálogo” não nos permite aprofundamento teórico sobre os temas propostos,
mesmo porque, cada tema aqui proposto e sucintamente debatido é fruto de
inquietações e inconformações de ambas as partes debatedoras, afloradas em um
momento de transição paradigmática onde se abandona o radicalismo do
positivismo, adentrando de forma agressiva no âmbito do Neoconstitucionalismo
(sic), aspirações pessoais das partes inerentes à forma de ensino adotada nas
cadeiras acadêmicas da graduação, demonstrando assim a necessidade de que
dogmas e aspirações sejam repensadas, sempre, objetivando alcançar o
inalcançável, a perfeição jurídica, essa utopia que nos leva a buscar cada vez
mais o aprendizado, a critica e a sistematização de todo o ordenamento
jurídico, não só como norma escrita, repetidora de casos já previamente
definidos, mas como forma transformadora da sociedade assumindo assim
importância política do nosso agora e principalmente do futuro.
1. Estagnação Política
O sistema político brasileiro, após apenas 22 anos de
promulgação da constituição de 1988, demonstra claramente um desgaste
institucional irreparável. A incapacidade dos partidos Políticos de agregar
valores de interesse social, a gritante desproporcionalidade dos interesses
sociais versus interesses corporativos dentro do congresso
nacional e demais casas legislativas, onde os ideários do real desenvolvimento
econômico, político e social, sem falar nos aspectos de desenvolvimento
cultural e ambiental, a serem abordados com mais detalhes posteriormente, são
ao meu ver, subrepresentados. Enquanto isto nos estados, as forças
oligárquicas, assustadoramente ainda imperam, conseguindo sempre o quorum de
representantes que necessitam, impondo as suas “próprias razões” em detrimento
de tudo e de todos, verdadeiro cancro cujos interesses se perpetuam
eternamente, interesses regionais conflitantes que secularmente obstam o
entendimento nacional. Este verdadeiro caos político é potencializado em
ano eleitoral, onde mais do que nunca, contrariando a premissa de que
"todo poder emana do povo" fica evidenciada a superposição dos interesses
particulares em detrimento dos sociais, a começar do nosso máximo dignitário!
Observa-se das colocações acima expostas a angustia de quem
parece ver aquilo que ninguém (políticos e autoridades no geral) vê.
Expectativas frustradas, direitos suprimidos, inversão de valores e submissão
daquilo que era pra ser o ponto central a ser perseguido. Indistintamente,
parece retrocedermos ao denominado por Norberto Bobbio como “Maquiavelismo”
onde o que importa é a vontade do “Príncipe”, aqui representado pelos
governantes, e não a do povo , ele (s) e seu (s) interesses, é o que mais
importa, seu (s) querer (s) são as leis, aquilo que deve ser respeitado e
seguido, estamos diante de um verdadeiro “estado totalitário” onde o poder é
soberano a tudo, e defino como poder, o dinheiro, a posição social, e
principalmente o cargo publico de autoridade a ser exercido, tratado e
conduzido em prol do “Príncipe”. Com isso observe a real inversão de valores,
parece absurdamente que voltarmos às eras obscuras e fétidas de nossa historia
política, onde o povo, e só o povo, gente, ou porque não, coisa, sem valor,
deve-se submeter indistintamente e totalitáriamente aos fins pessoais,
almejados pelas autoridades publicas.
O fato de estarmos em ano eleitoral, em nada muda, apenas infla,
a expressão demagoga e mesquinha de enaltecer e priorizar o povo. Mera
hipocrisia eleitoral. Tudo para ser o próximo “Príncipe”.
2. Desenvolvimento econômico versus
Legalidade
O país passa atualmente por um grande dilema entre a legalidade
e o desenvolvimento econômico, por exemplo, recentemente TCU E MP tiveram suas
recomendações de paralisação de obras do PAC, contrariadas pelo Planalto, que
removeu várias obras públicas com suspeita de superfaturamento, sobrepreço e
critérios de medição inadequados da chamada "lista Negra", esta crise
de identidade do Brasil não pode passar incólume pelo crivo da história, o país
necessita realmente de estruturação econômica de forma a poder competir no
cenário mundial em pé de igualdade com os outros emergentes, porém a que custo?
Em detrimento do sistema legal e do estado democrático de direito? É um absurdo
vermos, a despeito da legalidade e em nome do desenvolvimento econômico, os
diplomas legais sendo vilipendiados por interesses alienígenas, pois as
irregularidades de uma obra bilionária não podem ser ignoradas. É, no
mínimo, temerária a destinação dos recursos sob suspeita, vivemos uma
democracia representativa ou na verdade um sistema de exceção travestido de
democracia? Perdemos completamente a racionalidade decisória, esquecemos os
princípios básicos da administração pública, onde está a legalidade, a
eficiência? A premência de um pretenso desenvolvimento econômico poderá
sublevar os sagrados princípios antes citados e este é realmente o único
caminho do desenvolvimento? Sem dúvida o caminho da legalidade sempre será o
melhor, o mais seguro, por mais demorado que seja, principalmente porque a
exigüidade do tempo apregoada pelo executivo se deve sim a proximidade
eleitoral, e não ao comprometimento com o desenvolvimento nacional. Chegamos a
um ponto onde as contradições se retroalimentarão indefinidamente se não
iniciarmos um processo de desfragmentação da lógica de atuação do Estado Brasileiro,
através da adoção de um padrão de juridicidade realmente constitucional,
devemos recorrer sempre ao texto constitucional ou ter a coragem mudá-lo de
forma a atender as modernas demandas estatais, o que não podemos é nos
acostumar as inconstitucionalidades cada vez mais constantes, as quebras do
ordenamento jurídico em função dos interesses mais variados sob a premissa da
falta de contextualização da Constituição Federal, Respeite-a ou mude-a!
Nunca antes na historia desse pais, se falou tanto em desenvolvimento
sustentável ou mesmo, em estabilização da economia, isso muito nos alegra,
desde que não viole ou destrua aquilo que por décadas, ou melhor, séculos
construímos, um Estado Democrático de Direitos, sendo seu significado a
submissão não só da população como também do próprio Estado às leis, inúmeras
vezes vejo o Estado ser confundido, misturado, com o Governo, privilegiando
aquilo que se diz ser importante, como se a conquista histórica de uma
Constituição democrática e suas bases estruturais fossem resumidas a um segundo
plano de priorização. Devemos tomar cuidado ao falarmos de violação de regras,
que se limita a leis formalmente constituídas, a regra, possui, um sentido mais
abrangente, que como afirmo Robert Alexy, são elevadas a patamares de gênero,
sendo assim, leis e princípios são tidos também como regras, o que se deve
priorizar não é apenas o que está literalmente expresso em uma lei, deve-se
levar em conta a sua origem o seu objetivo o seu contexto, aquilo que visa
abranger. Os Princípios de Direito, verdadeiros alicerces de nosso ordenamento
jurídico, são diariamente desprezados, para não me delongar ainda demais, cito
por todos, a MORALIDADE parece ser norma vazia, sem conteúdo, pois nunca é
respeitada e quando invocada é descartado sob a pífia afirmação de que é muito
genérica sua definição, ou seja, rasgue-a e queime-a, pois pra nada serve,
mesmo porque, o que importa é a vontade do “Principe”.
3. Desagregação Social
No bojo de toda esta crise institucional está a desintegração do
sistema social, onde a quantificação da miséria tornou-se moeda de troca
política: quanto mais pobre maior controle estatal e maior a dependência social
dos ditos "programas", sem contar no destrutivo processo de
"proletarização" da classe média a qual nunca sofreu tanto quanto nos
últimos anos pilhada pelo peso dos impostos e sitiada dentro de seus lares,
temendo a perda dos poucos recursos que lhes restou. O recrudescimento da
violência nos grandes centros urbanos e o descrédito pelas instituições criou
uma glamourização da violência, uma verdadeira cultura da justiça com as
próprias mãos, bem como a desconsideração pelos direitos humanos em que grupos
de extermínio, milícias e congêneres, constituem uma das trágicas seqüelas da
desagregação social.
Planos assistencialistas são importantes, são, distribuem rendas
e levam a esperança aos que jamais tiveram antes, mas será que apenas isto
basta? Parece-me óbvio que não, após este fato, deveria o mesmo ser
“substituído” por uma qualificação, cultuar a valorização daquilo que se
recebe, incentivar a não estagnar sob a afirmação de que está bom, antes não
havia nada, agora temos algo. Chega, não somo alienados a ponto de nos
satisfazermos com esmolas, igualdade social não é dar um trocado aqui e outro
ali, a sociedade grita, em voz bem alta, por educação, saúde, emprego,
dignidade, respeito e outros mais. Não podemos resolver problemas de segurança
publica com o direito penal, a imposição de sanções severas, ou será que estou
errado em pensar que prevenir é melhor que remediar, educar é melhor que
prender e cuidar com respeito é melhor que descriminar. Por um acaso o filho do
“Príncipe” estuda em escola publica, se consulta pelo SUS e enfrenta filas em
busca de um emprego?
4. Descaminho Cultural
Também não poderíamos deixar de citar a constante desmobilização
cultural sofrida pela população, há uma contundente crise de motivação nos
meios culturais, a fecundidade cultural em todos os meios nunca esteve tão
estagnada, as classes mais baixas da população, que sempre foram caracterizadas
pela pródiga produção cultural, trazendo a lume nomes perenes no cenário
cultural até os dias de hoje, se limitam a reproduzir batidas ininteligíveis e
corpos nus num verdadeiro "Império dos sentidos" não há mais a poesia
do samba, das modas de viola e da seresta, neste mesmo contexto não há espaço
para os verdadeiros movimentos sociais. Aonde caberia o censo de coletividade
num meio de culto as sensações individuais, não é de se admirar que a
intolerância social nunca foi tão marcante, estampada diariamente nas páginas
dos noticiários. Tal postura individualista do ser humano, toda esta
desmotivação é em grande parte responsabilidade do estado que ao furtar-se de
suas responsabilidades, deixa o homem a sua própria sorte, não direcionando políticas
culturais e conseqüentemente não aguardando resultados, nada se pede e
também nada se faz.
Cultura, só se for a da “lei de Gerson – se dar bem a qualquer
custo”, nada se produziu, vivemos do passado, verdadeiramente “governados pelos
mortos”, pois os vivos parecem que não existem, exceto as exibições maciças de
corpos nuns completamente “modificados cientificamente em laboratórios” não se
fala ou mesmo se mostra outra coisa, além disso, raras são as expressões
culturais que levam um mover emotivo de nosso pensar, dói, pensar na cultura
atual, pois é vazia, escassa de conteúdo, completamente aculturada, sem
incentivo, sem investimento, hoje a cultura é sub julgada como coisa
secundaria, sem valor expressivo, onde com isso se manipula a todos a focarem
aquilo que querem que se preocupem. Talvez um dia veremos isso
mudar!
5. Equívoco Ambiental
Como alguém que se sente sozinho, desamparado pelo estado se
comportaria com relação ao ambiente em que vive? Ao vermos as encostas dos
morros pilhadas de lixo, por vezes indignamo-nos, porém como racionalizar os
óbices ambientais sem antes darmos soluções ao cidadão, que por vezes não se
sente como tal, a implementação de políticas publicas na área ambiental, pecam
por omitirem uma variável de suma importância na equação da preservação
ambiental: o ser humano! Despoluem-se as águas, porém o homem continua na
sub-moradia, sem saneamento e nem coleta de lixo, sem escola e sem emprego,
objetiva-se mais o "néon" da placa de inauguração do que a moradia digna
ao ser humano. Coíbe-se o desmatamento, encarcera-se o lenhador e o madeireiro
continua livre, onde estão as alternativas de emprego ao lenhador, ao
carvoeiro? E o menor semi-escravizado, onde estudará? Torno a repetir, toda a
política ambiental é nula se não passa em primeiro lugar pela dignidade do
homem!
O “Príncipe” encontrou a melhor forma de se livrar da
responsabilidade das conseqüências de catástrofes ambientais “o povo suja as
ruas e entope os bueiros com sua falta de educação”, ou seja, a culpa é do povo,
não é da falta de estrutura de uma grande cidade, que cresce desordenadamente,
não é dos responsáveis pela manutenção e criação de novos mecanismos de
tratamento e escoamento d’água, não é daqueles a quem compete zelar pelo bem
estar social e cultural, a falta de educação do povo também não é das
autoridades, pois pelo visto, de acordo com as afirmações por eles prestadas,
educação eles dão. Enfim. Acho que na verdade, a culpa realmente é do povo, que
insiste em insistir nessa forma de administração publica.
6. Causas Históricas
Ao verificarmos todos os óbices aqui apresentados, temos a
certeza de que somente a história pode explicar um estado atual de coisas de
tão grande gravidade. De forma realista, sabe-se que sempre as elites foram as
responsáveis pelos destinos do povo, pelos rumos tomados por uma nação ora em
formação, ao retrocedermos no tempo, podemos constatar que a forma de
colonização do Brasil influiu preponderantemente na maneira em que nos
apresentamos hoje como povo, como é a nossa personalidade enquanto Estado
Independente, interna e externamente. Nosso país surgiu como colônia de
exploração e durante 30 anos após o seu descobrimento não despertou interesse
da coroa Portuguesa, somente após a ameaça iminente de perda total do território
para França e Holanda é que a decisão de colonizar foi tomada, exatamente por
não possuir atrativos econômicos, fato somente superado através da exploração
do Pau-Brasil. Sucedem-se então no Brasil - Colônia, vários ciclos econômicos,
caracterizados exclusivamente pelo exaurimento dos recursos naturais pátrios em
face da coroa portuguesa, sem preocupação alguma com a Colônia propriamente
dita. Capitanias Hereditárias, A União Ibérica e a conseqüente Expansão
Territorial através dos Bandeirantes e os Vice-reis, culminando na vinda da
Família Real em 1808, tudo motivado pela política colonial de Exploração, e
após a "Independência" em 1822 surge um novo Estado, com
características bem peculiares, onde a união entre a tradição
agrária/extrativista une-se a corrupção estatal, prática portuguesa muito bem
aprendida, e posta em uso até os dias de hoje, que já àquela época dava bem
seus ares, tornando-nos desde a origem um estado dependente e corrupto, agora
das potências emergentes: Inglaterra e EUA, o último ao qual ainda hoje
prestamos reverência, a despeito da resistência de alguns em admitir tal fato.
Somente adentramos a Revolução industrial nos anos 30 do séc. XX, curiosamente
pelas mãos de um ditador e desde então vivemos nos altos e baixos das
tentativas isoladas de nos livramos da herança maldita de séculos de
exploração, levantando e tombando em meio ao descaminho de recursos, corrupção,
falta de amor ao verdadeiro sentido de pátria, pois todos os nossos destinos
foram traçados por terceiros, e nós povo, sempre nos conformando em assistir a
distância às ditas "revoluções" (todas elas!), salvo raríssimas
exceções. Me pergunto o porquê dos maiores rompantes de desenvolvimento de fato
deste país terem sido engendrados através de líderes populares, independentemente
do tempo, avessos quase sempre à discussão democrática e a um custo
altíssimo para a sociedade seja em termos de supressão das liberdades
individuais, seja da dilapidação do erário público ou de ambos, será que sempre
teremos que pagar tal preço pelo desenvolvimento? Quando nossas instituições
democráticas estarão maduras o suficiente para promover o Brasil sem o efeito
colateral de ônus sociais tão altos e sem a necessidade do famigerado
populismo? Estamos acostumados a estar à margem das decisões, pois sempre há
alguém "mais preparado" para tomar as grandes decisões em nome do
povo, que tem sua parcela de culpa no imediatismo egoísta do colonizado, mas
também foi cuidadosamente mantido inculto, marginalizado de todos os processos
políticos da história brasileira, com a única razão de obedecer sem questionar
os jugos que lhes eram impostos. Hoje em pleno séc. XXI ainda há quem não
enxergue que o Brasil só será passado a limpo quando uma parcela significativa
da sociedade participar de fato do processo político, finalmente subjugando a
maldição da colônia. Como isto se dará, somente o tempo e a educação dirão.
Comparo esse retroceder histórico como de suma importância para
com nossa realidade, a historia, e somente ela, nos diz quem somo, de onde
viemos, e para onde vamos, passamos, por todas as etapas evolutivas de uma
sociedade totalitarista, déspota, rumo a uma qualificação libertária,
democrata, preocupada em um primeiro momento com a dignidade da pessoa
individualmente considerada (direitos fundamentais de 1ª geração), visando
proteger sua liberdade, dos ataques déspotas governamentais, conseqüentemente
passamos uma nova fase de proteção de nossos Direitos Fundamentais, a contra
prestação estatal, onde o Estado passa a ser o responsável em priorizar
direitos como também a protegê-los de forma eficaz, no atual estágio em que nos
encontramos, estamos na era dos direito Fundamentais de 3ª geração, onde se
busca a proteção e respeito aos direitos sociais, tudo isso, fruto de um
percurso histórico, de evoluções filosóficas, jurídicas, sociais e políticas.
Com isso, vê-se a importância da história, das origens remotas e próximas de
nossa cultura em um todo, nosso passado não profetiza nosso futuro, devemos
sim, pleitear, lutar e esbravejar por uma história digna, onde a luta
incansável pela melhoria foi marco inspirador nas batalhas.
O estado liberal com a abertura dos portos e livre
comercialização de produtos foi apenas a mola propulsora de toda essa
trajetória histórica, mesmo antes de sermos descobertos, o que ocorre, em meu
ponto de vista, é a falta de interesse governamental e mudar o rumo dessa
história, cabendo novamente a nós, povo brasileiro, entrarmos no campo de
batalha, e lutarmos com todas as forças, para só assim, podermos ver nossos
anseios saciados.
7. O Papel Transformador do Direito
Depois de todo este contexto apresentado, adentro a seara do
Direito questionando: a que se destina o papel do Direito nesta sociedade? Qual
sua finalidade, seu objetivo? Seria ele um mero reprodutor desta realidade
social, que utiliza formulas prontas e doutrinas muitas vezes alienígenas à
nossa verdade social? O que se observa ultimamente é uma verdadeira enxurrada
de pensamentos arcaicos, despejados voluptosamente no mercado em função da
recente demanda editorial. Preocupante o fato de que a grande maioria das
ditas “doutrinas” em nada tem de originais, tratam-se meramente de reproduções
de verdades prontas e reconhecidas como inquestionáveis, que poucos se atrevem
a contestar ou inovar sob o risco de desmoralização, pois surgiram das idéias
dos “saudosos” grandes mestres A, B ou C! Não estaríamos nós operadores do
direito desviando-nos da finalidade mais nobre da causa, que é utilizar o
Direito como elemento de Transformação social e não como mantenedor do estado
atual das coisas? .
Não estou aqui cometendo a heresia de invalidar a contribuição
dos grandes mestres, mas preocupa-me a aparente crise legal que vivemos hoje em
dia, crise esta que, verdadeira ferida aberta no tecido social, talvez seja
oriunda do comodismo intelectual a que nos submetemos, pois estamos limitados a
apenas absorver um conhecimento “requentado” sem questionar a sua
contextualidade, temos que aprender a separar o “joio do trigo...”.
Todas as grandes transformações ocorridas na
história humana, desde a Queda da Bastilha e a Revolução Industrial, receberem
em seu seio a contribuição ativa dos Operadores do Direito que ao questionar as
ditas "verdades universais" e, sobretudo revestidos de coragem,
enfrentaram pensamentos modais e atitudes rotineiras da sociedade vigente por
vezes com o sacrifício da própria vida. Ocorre-me que sendo a História da
humanidade cíclica, vez por outra cabe ao Operador do Direito, causar agitação
na "água do poço" de forma a forçar as pessoas a reverem seus
conceitos e alterarem o "in statu quo res erant ante bellum" através
do PENSAMENTO E DA PALAVRA. Assim sendo, se nos limitarmos somente a acatar e
reproduzir cegamente o pensamento alheio estaremos negando o caráter
transformador histórico do nosso sacerdócio.
É muito interessante observar que embora o Fenômeno do
Direito emane obviamente do seio da sociedade e preexista até à idéia de
Estado, muitos ainda insistem em elevar a materialidade do fenômeno Jurídico a
um patamar exagerado, ignorando a subjetividade que lhe é característica. Ora,
o ser humano é na sua essência subjetivo! Seria extremamente simplista afirmar
que Direito é somente a Fria Letra, a Coisa, O Fato ou O Procedimento, também o
é! Mas, principalmente, Direito são as pessoas e as pessoas mudam, mudam de
opinião, de humor, de lugar, etc. O direto será sempre um canal de mudanças
enquanto oriundo do "querer coletivo", como ensina Miguel
Reale em suas Lições Preliminares de Direito.
Talvez exatamente por conseguir exprimir a vontade humana,
assuste tanto a idéia de discussão, que longe do sentido pejorativo proporciona
um embate Intelectual, construindo "novas metas e meios sociais"
nas palavras de Robert King Merton em sua obra Estrutura Social e
Anomia. É essa a função transformadora do Direito, a qual atende aos
anseios da população, e que longe das verdades comerciais proporciona um Norte
para a sociedade, e quem tem a bússola nas mãos somos nós operadores do
Direito!
Essa influência do direito na realidade, tem efeitos concretos
na nossa história recente, um bom exemplo é o dado pelo juiz Pernambucano
Pierre Couto Maior Coutinho de Amorim: "Exemplo claro da
possibilidade de influência do direito, agora na acepção objetiva/subjetiva,
está na aplicação do Código de Defesa do Consumidor, lei n. 8.078/90. Notou-se
uma grande mudança na qualidade dos bens de consumo colocados no mercado após a
validade e vigência desta lei. O consumidor brasileiro passou a exigir em maior
grau um bom nível na qualidade dos produtos e uma conduta mais ética dos
fornecedores desses bens. E quando não adimplidas essas exigências, os juristas
aplicaram as sanções previstas, o que terminou por modificar o meio
social." O nobre jurista aqui afirma que a atuação objetiva
do Direito do Consumidor, resposta estatal ao clamor social, terminou por
modificar condutas, alterou objetivamente o dia-a-dia da população, que até
então sofria com a falta de qualidade de produtos e serviços e a partir da
vigência do novo diploma experimentou uma mudança radical da referida qualidade.
De fato, ainda há muito a ser explorado e definido nesta seara:
a real valoração dos direitos fundamentais no ordenamento jurídico, uma Nova
Hermenêutica Constitucional, Civil, Penal, etc. Tudo isto, em face da nova
sociedade que se apresenta, têm ainda um ideário difuso, e talvez este seja um
dos principais motivos, pelo qual o culto à forma e ao objeto ainda estejam tão
presentes, subestimando a vastidão do universo das interações socioculturais.
Cabe-nos então, lutar pela incorporação mais célere da dignidade humana às
normas, seu reconhecimento pela ordem jurídica e pelo mundo acadêmico, trazendo
cada vez mais as questões sociais a lume e demovendo seus opositores (que não
são poucos) do cômodo e seguro “berço esplêndido”.
Por muito tempo a comunidade jurídica, estagnou, ao ater-se à
denominada pseudodoutrina, ou seja, pensam que doutrinam, manuais meramente
repetitivos, como se estivessem se acovardando frente a realidade
transformadora que é o direito, limitando-se a transcrever o que se escreveu,
sem pesquisa, sem cultura, sem interesse em ensinar, apenas interesse em
vender. Infelizmente, vivemos um verdadeiro “estelionato intelectual”, não no
sentido jurídico da palavra, mas em seu sentido social. Certa vez ouvi, de
forma infeliz um dito “doutrinador” afirmar que, “mente aquele que diz não
temer se contradizer”, ora, somente se contradiz aquele que pensa, escreve e
evolui, assim já afirmava o professor Paulo Nader. Logo, apenas aqueles que
pensam, evoluem e logicamente estudam é que podem fazer a diferença dentro
deste contexto em que vivemos.
Quanto ao fato de estarmos vivenciando uma crise intelectual,
remeto ao dialogo acima já firmado.
A titulo conclusivo desse diálogo, tão inspirador e rico em
informações, argüições e expressões de revolta, ou melhor, indignação com a
realidade atual que circunda nossos sombrosos dias, deixo uma expressão, muito
eloqüente que talvez seja a mais realista e definidora dessa história.
Boaventura de Souza Santos dizia: “é, pois, justificado a advertência sobre
descobrirmos com atraso o que sabíamos quando nos considerávamos atrasados”.
Ora, sejamos óbvios com nossa realidade, pois a meu ver, o
objetivo desta estagnação social, jurídica e política, redundará em objetivos
predominantemente destruidores, mantendo a presente ordem, e até mesmo
subvertendo o resquício da política democratizada alcançada pelas lutas e
vitórias mostradas por nossa história.
Passar bem, e que seus anseios sejam apenas, como um instrumento
de alcance intelectual, “nunca antes visto na historia desse pais”!
Publicado por: João Paulo da Silva Faria
Fonte: http://www.ebah.com.br/content/ABAAAAwEMAK/direito-como-elemento-transformacao-social-http-direitosociedadeeutilidade-blogspot-com
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